terça-feira, 12 de fevereiro de 2008

Números impressionam


Números impressionam


Clóvis Augusto Melo - Correspondente em Curitiba

Enquanto muitos proprietários de terras se vêem às voltas com a equação "valor da terra nua X hectare com floresta", a mata atlântica propõe uma outra conta: quanto vale a vida, a biodiversidade e a garantia de água para as futuras gerações?

"É importante colocar essa questão da água", diz a diretora do SOS Mata Atlântica, Márcia Hirata. "É algo que as pessoas podem valorizar, pois elas sabem que a água não nasce na torneira. A mata atlântica contém sete das nove grandes bacias hidrográficas do País. Proteger a mata é garantir o abastecimento de água ", destaca. São águas que abastecem mais de 100 milhões de pessoas, em 3,4 mil municípios.

Além das águas, a mata atlântica possui números impressionantes relacionados à fauna e flora. Em seus 1,3 milhões de quilômetros quadrados (15% do território nacional) espalhados sobre 17 Estados brasileiros, ela abriga 261 espécies de mamíferos, 197 de répteis, 340 de anfíbios, 350 de peixes, 1.020 de pássaros, 1.711 de vertebrados e fantásticas 20 mil espécies vegetais. Sem contar insetos e demais invertebrados e as espécies que aguardam ser descobertas.

Mas os números também mostram um quadro preocupante: dos 633 animais ameaçados de extinção no Brasil, 383 vivem na mata atlântica. A busca pela preservação levou à implantação de 1,4 mil unidades de conservação, entre parques, reservas, reservas particulares do patrimônio natural (RPPN) e estações ecológicas. A reserva da biosfera da mata atlântica é a maior reserva de floresta do mundo, com 35 milhões de hectares.

O coordenador do Núcleo de Mata Atlântica do Ministério do Meio Ambiente, Wigold Schäffer, conta que uma estrutura degredada de floresta leva de 60 a 80 anos para se regenerar. "Uma coisa é recompor uma cobertura vegetal; outra é recompor a biodiversidade. Muitos deixaram de existir em alguns lugares", lamenta.

É o caso da onça-pintada, que precisa de pelo menos 100 mil hectares para sobreviver e que só é encontrada atualmente no Paraná em algumas áreas do parque Iguaçu e do litoral do Estado.

Preço baixo: inimigo

Talvez o maior inimigo da mata atlântica seja justamente o baixo valor que as áreas com floresta possui. "Em Imbituva, um hectare de floresta vale em torno de R$ 1,5 mil. Essa mesma área, limpa, pode chegar a R$ 40 mil", explica o superintendente regional do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Hélio Sydol.

"É preciso uma política pública que mude essa equação, para que as pessoas que possuem uma floresta ganhem com isso, até chegar ao ponto de que elas passem naturalmente a reconstituir a mata", comenta Sydol.

O secretário de Estado do Meio Ambiente, Rasca Rodrigues, cita o caso do município de Coronel Domingos Soares (oeste do Estado). "Lá, a cobertura florestal passa de 65%, mas os proprietários se sentem lesados por não terem desmatado e agora estão impedidos de fazê-lo", conta Rodrigues.

"A situação é que a soja e o gado têm preços melhores e acabam pressionando o desmatamento sobre esses remanescentes florestais", comenta.
A Lei nº 11.428, de 22 de dezembro de 2006, que dispõe sobre a utilização e a proteção da mata atlântica, prevê um fundo de compensação para quem preservar o bioma, mas ainda depende de regulamentação.

O Ibama realizou oito grandes operações de combate ao desmatamento entre 2003 e 2006, principalmente na área centro-sul do Estado, na região do município de Antônio Olinto, na serra da Esperança, no sentido de Prudentópolis, além de Guarapuava, Laranjeiras, Candói e fechando o círculo por Mangueirinha, Clevelândia e na divisa com Santa Catarina. As ações incluem sobrevôos com helicópteros com demarcação via satélite e retorno por terra para checagem dos locais.

O órgão possui 26 fiscais para cobrir todo o Estado, mas normalmente trabalha com o reforço da Polícia Federal e troca informações com os órgãos estaduais. O superintendente do Ibama espera que, um dia, não seja mais necessário lavrar multas.
"Enquanto tivermos que fiscalizar, estaremos andando em círculos. Quando a floresta é derrubada, o dano é incomensurável", alerta. "Meio ambiente é consciência e educação".

Paraná reduz a devastação da mata atlântica em 90%, diz estudo

A mata atlântica, bioma caracterizado por um conjunto de ecossistemas formados por florestas, matas, campos e mangues e todos os seres que ali vivem, está reduzida a 7% da cobertura original no Brasil. O Paraná pode comemorar o fato de ter diminuído a devastação em mais de 90% nos últimos anos.

Entretanto, o Estado ocupa um nada honroso segundo lugar no ranking das Unidades de Federação em que a mata atlântica foi mais devastada no período de 2000 a 2005. Da cobertura original no Paraná, restam apenas 10,58%.

O estudo que mostra tais números é da Fundação SOS Mata Atlântica (entidade privada de defesa ambiental sem fins lucrativos) e do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e está registrado no Atlas dos Remanescentes Florestais da Mata Atlântica, elaborado desde 1989.

"O bioma no Paraná sofre grande pressão de madeireiras, exploração de florestas e já possui um histórico de desmatamento", comenta a diretora de gestão do conhecimento da SOS Mata Atlântica, Márcia Hirota.

Existem ainda outros motivos para a degradação da mata atlântica. Entre eles, o baixo valor por hectare das terras cobertas pela mata e os baixos valores das multas: de R$ 1,5 mil a R$ 50 mil (esta, em caso de desmatamento em área de proteção permanente) para os que derrubam as árvores e queimam os campos para lavouras ou pastagens.

Segundo a diretora da Fundação SOS, o Paraná foi campeão de desmatamento entre 1985 a 1990 e de 1995 a 2000. "Nós não somos contra o uso e exploração da floresta, mas isso deve ser feito de forma adequada e de acordo com a lei", diz Márcia.

O secretário de Estado do Meio Ambiente, Rasca Rodrigues, não contesta os números do Atlas, mas ressalta que é preciso reconhecer o avanço em relação à diminuição no desmatamento no Paraná. "Diminuímos 90%, mas os 10% restantes acabaram representando 28 mil hectares, o que nos deixou na segunda colocação."

O secretário revela que os principais motivadores do desmatamento no Estado foram a ocupação de assentamentos, incêndios e manejo da bracatinga. "Durante muitos anos, até os próprios organismos oficiais, como o Banco do Brasil ou a Café do Paraná, incentivavam o desmatamento", lembra Rodrigues.

"O governo foi parceiro de muitos desses crimes ambientais em outros tempos. O que estamos discutindo hoje não é a floresta que perdemos, mas a reserva legal, cujo desmatamento já era proibido e que desapareceu, levando com ela a mata ciliar."
Para 2008, o secretário afirma que diversas operações de combate ao desmatamento estão sendo planejadas e destaca o trabalho que o Instituto Ambiental do Paraná (IAP) vem fazendo. "Há um sistema de fiscalização por satélite praticamente em tempo real, com uma precisão de cinco centímetros", conta Rasca Rodrigues.

Além disso, segundo ele, a fiscalização ambiental conta com três aeronaves, 36 barcos e mais de cem veículos. O efetivo da Polícia Ambiental foi aumentado em 50%. A secretaria investe também no programa Matas Ciliares e, para este ano, planeja o plantio de mais de 100 milhões de mudas.


Fonte: O Diário do Norte do Paraná
Foto: Fernanda Kock - RPPN Rio das Lontras

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