segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

Maria Teresa Jorge de Paduá e Floripa


Maria Teresa Jorge de Paduá faz parte da história da movimento ambiental brasileiro. Paulista de São José do Rio Pardo, formada em Agronomia, com mestrado em Ecologia e de Manejo da Vida Silvestre, trabalhou no departamento de meio ambiente da Companhia de Energia de São Paulo, no IBDF foi chefe da seção de parques nacionais e diretora do departamento de áreas protegidas (saiu de lá em protesto contra a construção de uma estrada cortando o Parque Nacional do Araguaia em pleno governo Figueredo), presidiu o Ibama e foi uma das criadoras da Funatura, uma das ONGs ambientalistas mais tradicionais que atuam no país.
A primeira vez que ouvimos falar de RPPN foi através de uma entrevista dela para a TV Cultura de São Paulo e que assistimos num fim de semana quando morávamos em Floripa.
Foi daí, que decidimos que queríamos ter uma Reserva Particular do Patrimônio Natural.
Nesse artigo para o site O Eco ela faz um diagnóstico ambiental da cidade que tanto amamos e que nasceu nossa filha
Fernanda .

A culpa é da área ambiental
O ECO - 13.02.2008


Imediatamente antes do Carnaval, a cidade de Florianópolis foi atingida por uma chuva muito intensa e de longa duração que provocou inundações e trouxe muitos danos materiais aos moradores e prejuízos ainda não dimensionados na área do turismo, mas que se calcula estar na ordem de 20% de desistência das reservas feitas na rede hoteleira. O estado quase como um todo foi atingido pelas fortes chuvas. A BR-101 ficou intransitável em vários trechos e o fogo do carnaval na ilha de Santa Catarina se apagou com as chuvas, a sujeira das praias, a dificuldade de acesso, os congestionamentos, a falta de energia ou água nos hotéis e em diversos bairros. Moradores como nós que gostamos de paz e tranqüilidade fomos surpreendidos pelo silêncio abrupto em tempos de bagunça e bum, bum, bum.

Mas a grande surpresa mesmo foi a declaração, várias vezes reiterada pelas autoridades municipais locais, que as inundações e todas as mazelas de suas conseqüências foram culpa, ou do Ministério Público, ou das autoridades ambientais, pois não forneceram as devidas autorizações para se limpar bueiros, canais de drenagem, desassorear e drenar riachos, lagoas e rios e outras baboseiras mais.


Interessante mesmo é se constatar que o grande volume de chuva causou tanto impacto indesejado exatamente pelo motivo contrário, isto é, porque muitas autoridades constituídas não fizeram cumprir a legislação em vigor ou os planos diretores. Basta uma volta na ilha de Santa Catarina para se observar que a cada dia a ocupação dos morros progride para cima dos mesmos, desafiando as altas declividades e que as restingas e mangues vão sendo destruídos e ocupados, em franca desobediência legal.

Talvez por isso mesmo assistimos o episódio da Moeda Verde que tanto nos constrangeu. Claro que com o desmatamento das montanhas, desmatamento de Mata Atlântica, diga-se de passagem, e com o aterramento e ocupação dos mangues, zonas baixas e instáveis, a gente perde a oportunidade de contar com o mata borrão da vegetação, e, assim sendo, as águas ganham mais velocidade e causam mais danos à população e a seus bens. É simples, é uma equação direta, mas ninguém quer saber de mencionar o assunto, ou com ele se preocupar, a não ser quando ocorrem os deslizamentos, as inundações, as mortes e os prejuízos materiais.
As áreas que foram mangues naturalmente e que sofreram aterramentos para a construção de residências, lojas, hotéis ou shoppings, foram as mais atingidas, ficaram intransitáveis, entre elas a que tem o maior shopping da cidade. Eles sabiam que estavam usando áreas de risco, que ademais são de preservação permanente pelo só efeito da Lei, mas conseguiram contorná-la e agora querem rasgar vales, drenar, fazer obras, que o Ministério Público muito apropriadamente proíbe, para evitar futuras inundações.


A ilha de Santa Catarina, ou melhor, o município de Florianópolis é, não obstante todo o mau trato que vem sofrendo principalmente nas duas últimas décadas, privilegiado sob vários aspectos e entre eles o natural. Todos nós sabemos quão bela e atraente é a cidade de Florianópolis. E é bela e atraente porque, além de suas magníficas praias possui muita cobertura vegetal que lhe dá características de paisagens raramente encontradas em outros locais do globo.
O município de Florianópolis tem 436,5 km² de extensão territorial e possui na ilha de Santa Catarina e seu entorno 24 unidades de conservação ou áreas protegidas estabelecidas, que na teoria somam 30.000 hectares ou 300 km². Algumas são minúsculas e nem merecem referência, não obstante serem importantes para os bairros onde se localizam, outras, no entanto, são expressivas, como: A Estação Ecológica Federal de Carijós de mais de 700 hectares; Reserva Biológica Marinha do Arvoredo com 17.800 hectares, Parque Estadual Florestal do Rio Vermelho com mais de 1.200 hectares, Parque Municipal da Lagoa do Peri com 2.000 hectares; Parque Municipal do Maciço da Costeira com 1.400 hectares: Parque Estadual da Serra do Tabuleiro com a área total de 87.000 hectares dentre os quais mais de 340 ha dentro da ilha de Santa Catarina.


Muitas foram tombadas através de decretos municipais, parece que para serem protegidas das próprias autoridades municipais ou das mazelas de algumas delas, como, por exemplo: a da Floresta do Hospital de Caridade, com 16 hectares: a da Lagoinha da Chica e Lagoa Pequena, com 31 hectares: área Tombada da Lagoa da Conceição com 967 hectares, a das Dunas dos Ingleses, Santinho, Campeche, Armação e Pântano do Sul, que somam 443 hectares, das Restingas de Ponta de Canas e Ponta do Sambaqui, com quase 23 hectares; Reserva Extrativista Marinha de Pirajubaé com 1.400 hectares; alguns hortos florestais e parques ecológicos minúsculos e inexpressivos. No entanto, há de se convir que as unidades de conservação ou áreas protegidas decretadas na ilha e seu entorno são bem numerosas, embora muitas delas não representem exatamente matas ou ecossistemas primitivos, algumas terem pinus e eucaliptos, outras estão sendo invadidas ou dilapidadas paulatinamente e, como sempre, não possuem nem infra-estrutura, nem um adequado e moderno manejo no campo. Porém as unidades existem legalmente e só por este fato dão a esperança que elas serão protegidas e adequadamente manejadas no futuro.

Desejar que a ilha de Santa Catarina não se torne só uma saudade do tipo, “Ah! Como era bela, tranqüila e aprazível”, depende eminentemente dos políticos que, na sua maioria, parece só querer mais loteamentos, campos de golfe, hotéis, mais turistas e muito mais “grandes negócios” que beneficiam a uns poucos. Tudo isso até é possível, mas há que se ter um plano diretor sério, que seja obedecido e que não mude por complacência ou corrupção. Há que se obedecer, por Deus, a legislação em vigor, principalmente o Código Florestal; há que se respeitar o Ministério Público, que tem agido com muito comprometimento e; há de se explicar aos moradores, quer sejam ricos ou pobres, que o futuro da ilha e o deles, também, depende, em grande medida, do envolvimento cada vez mais forte das comunidades e associações de pescadores de bairros e das minguadas ONGs ambientalistas existentes. Depende mais que tudo de educação e de se escolher um norte: ou se ter uma cidade linda, limpa, saudável, invejável, com bastante vegetação e fauna, para nós e para os nossos filhos viverem com saúde e felicidade; ou se ter, por exemplo, uma Cancun da vida, só para receber milhares ou milhões de turistas, que não se importam com o destino dos nativos e residentes e onde os mesmos vão procurar jogos e fantasias, legais ou não, e propiciar insegurança e instabilidade, enquanto seus habitantes vivem tristemente acuados nos tugúrios, apenas para atender os caprichos dos visitantes.

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