terça-feira, 25 de dezembro de 2007

Mocorongo

"Mocorongo" é um termo muito utilizado (em especial nos estados de SP, RJ e ES) que significa - segundo o Aurélio - caipira. Mas também pode ser usado para definir alguém brega, fora do contexto, burro!

Pois é assim que podemos definir quem destrói o meio ambiente, que derrubam árvores, prendem pássaros em gaiolas, espalham lixo por onde passam, são contrários às Leis Ambientais e ignoram a necessidade mais que tardia de ações para a proteção da biodiversidade.

É o que parece acontecer quando há a possibilidade de ser criada uma nova Unidade de Conservação. Os "mocorongos" da vida saem do armário, vomitam seus venenos e lutam contra qualquer iniciativa de criação de áreas de conservação da natureza, seja de uso sustentável ou de proteção integral, em qualquer parte do país. Geralmente é um grupo composto por políticos interesseiros, empresários predadores e pessoas ignorantes.

Evitam qualquer tipo de diálogo, usam de expedientes grosseiros, intimidação e argumentos nada consistentes para tumultuar e impedir o nascimento de uma área protegida por Lei. É o que parece estar acontecendo no litoral de Santa Catarina, conforme a matéria do Diário Catarinense desse último domingo:

Reportagem Especial

Paraíso sob perigo
Criação de reserva extrativista para a pesca artesanal em Garopaba e Imbituba provoca polêmica na comunidade do Litoral Sul do Estado

A criação de uma reserva extrativista de pesca artesanal englobando os municípios de Imbituba e Garopaba, no Litoral catarinense, está cercada de polêmicas e incertezas. O decreto que oficializa a área pode ser assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva ainda no início de 2008.

A chamada Reserva Extrativista (Resex) da Pesca Artesanal de Imbituba e Garopaba prevê que uma área que se estende 30 quilômetros do Litoral local (18 quilômetros em linha reta) até uma faixa de 5 milhas náuticas (cerca de 10 quilômetros) mar adentro sejam utilizadas pelos pescadores artesanais da região.

Duas consultas públicas foram realizadas para discutir o assunto com a comunidade local. A primeira ocorreu, quarta-feira, em Garopaba. A segunda, na quinta-feira, no salão paroquial de Imbituba. Elas tiveram o objetivo de fazer ajustes na delimitação da área que fará parte da unidade ambiental. O objetivo da Resex seria proteger os meios de vida e a cultura do pescador local, assegurando o uso sustentável dos recursos naturais. O projeto também prevê a preservação da área de 33 metros dos terrenos de Litoral, a partir da área de influência da maré, os chamados terrenos de marinha.

A polêmica da Resex inicia-se no ano de 2005. Foi quando o Fórum da Agenda 21 Local da Lagoa de Ibiraquera encaminhou ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), órgão que era então responsável pela criação e gestão de unidades de conservação federais, a solicitação de criação de uma reserva extrativista nos dois municípios.

A partir da solicitação, servidores do Ibama realizaram vistorias na região. O objetivo de avaliar se a solicitação era legítima e representativa, bem como viável. Estudos foram promovidos até outubro, quando 19 pesquisadores e gestores envolvidos participaram de um seminário de avaliação.

As reservas extrativistas são uma aposta do novo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, que é o mais novo dos órgãos ambientais do governo federal. Criado em agosto último, o instituto surgiu do desmembramento do Ibama, e tem como principal missão administrar as unidades de conservação federais. Executa as ações da política nacional de tais unidades. Pode propor e implantar as unidades criadas pela União.

Hoje, existem 52 reservas do tipo extrativistas em todo o país, concentradas sobretudo na região Norte. Outras 117 estão em processo de criação, uma das quais no Litoral Norte de Santa Catarina, na região de São Francisco do Sul.

No entanto, comunidades locais de Garopaba e Imbituba, inclusive de pescadores, estão se posicionando radicalmente contra a criação da Resex. Entre os motivos que justificam a posição, a possibilidade de severas restrições aos investimentos econômicos nos dois municípios, sobretudo na área de turismo.



A beleza da Lagoa de Ibiraquera, em Imbituba - Foto: GUSTAVO RIZZI

Projeto deverá delimitar 30 quilômetros da costa

O projeto prevê a delimitação de uma área de 30 quilômetros de costa - cerca de 18 quilômetros em linha reta - que estende-se de Garopaba até a Lagoa de Ibiraquera, em Imbituba. O município mais atingido é Garopaba.

Um dos itens que intrigam moradores, pescadores e o poder público local é se existe a possibilidade de mudanças radicais nas áreas limites da reserva. O resumo da proposta de criação da Resex traz como critérios utilizados para a delimitação da proposta da unidade de conservação a "exclusão, sempre que possível, de residências de moradores não tradicionais ou de veraneio e de atividades legalmente instituídas, desde que não comprometam a manutenção da conexão dos ambientes naturais da área de estudo".

Para muitos dos que se posicionam contrários à reserva, o polêmico texto abre espaço para as desapropriações. A criação de um conselho, formado em sua maioria por pescadores, cria expectativas. Na mão desse conselho gestor poderia estar o destino de toda a área, caso a Resex seja implementada. Também há a preocupação de incluir na área da reserva "as maiores áreas possíveis de vegetação natural e dos abrigos para a fauna nativa".

A Praia de Garopaba, tradicional reduto de pescadores - Foto: MARCELO BITTENCOURT



Decreto pode sair no início de 2008

O coordenador-geral de reservas extrativistas e reservas de desenvolvimento sustentável do Instituto Chico Mendes, Alexandre Cordeiro, prevê que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva possa assinar o decreto que institui a reserva extrativista de Garopaba e Imbituba já no início do ano.

Cordeiro coordenou as duas consultas populares, que servirão para ajustar os limites da área que será transformada em reserva. De acordo com Cordeiro, não haverá desapropriações ou prejuízo às atividades que são desenvolvidas nos dois municípios.

Ele explica que os estudos indicam "fortíssima viabilidade" para criar a Resex. Os custos com desaproriações são baixos. De acordo com ele, o Instituto Chico Mendes não vai "desenvolver atividades desapropriatórias".

- Criou-se uma idéia de que nós vamos desapropriar muita gente, mas não é nada disso. O que muda, basicamente, é que haverá benefícios para a pesca artesanal. Grandes pesqueiros vão poder navegar, mas não poderão pescar dentro dos limites da Resex. Também não haverá restrições aos esportes náuticos - explica o coordenador-geral.

De acordo com o Cordeiro, há desinformação sobre o projeto.



Comunidade terá representantes

Após a criação da Resex, será instituído seu conselho gestor, formado em sua maioria por pescadores, mas também por representantes da comunidade, ainda a serem definidos.

A partir daí, deve ser elaborado o chamado plano de manejo e sua zona de amortecimento. Isso é que tem tornado mais difícil o entendimento entre o governo e a população contrária à reserva.

O plano de manejo da Resex seria o conjunto de diretrizes, especificadas através de pesquisa e levantamentos, para proteger fauna, flora, recursos hídricos. Deve prever o que é necessário ser feito para proteger e utilizar a reserva de maneira adequada.

Esse plano pode demorar até cinco anos para ser concluído. Nesse período, está prevista a utilização da área de amortecimento. O conselho terá poder de indicar em que pontos da reserva e até que distância da reserva ficaria tal área. Nela, as atividades estão sujeitas a normas e restrições específicas.

Muitos dos locais contrários à idéia alertam que a chamada zona de amortecimento poderia inviabilizar a atração de empresas e mesmo afugentar empreendimentos que já existem nessas áreas.

- A preocupação nessa área será com atividades de grande impacto, como rodovias ou hidrelétricas. Construção civil e obras urbanas serão responsabilidade e fiscalização do poder público estadual. A maior preocupação é com as bacias hidrográficas da área - diz Alexandre Cordeiro. (RM)

Pescadores estão divididos na questão

Embora tenham se apresentado em menor número nas audiências públicas, os defensores da reserva extrativista entendem que a unidade dará um salto de qualidade de vida e de desenvolvimento para as comunidades locais.

Crêem numa circunstância que beneficie ao mesmo tempo a preservação ambiental e melhorias no turismo. A demanda pela criação da reserva partiu da Associação de Pescadores da Comunidade da Ibiraquera (Aspeci).

- A restrição de pesca industrial será excelente, pois nos garante o retorno da boa pescaria artesanal. Na parte continental, o turismo sai ganhando também. Muita gente não pode chegar perto das lagoas em algumas áreas porque foram colocadas cercas indevidas. A Resex vai acabar com isso - argumenta o pescador Joceli José Ribeiro.

Mas um grande número dos pescadores artesanais da região que estará dentro de seus limites está reagindo. Em Imbituba, uma das colônias que tem demonstrado grande descontentamento é a Z-13. Seu presidente, Antônio Carlos Teixeira, demonstra descontentamento com a idéia.

- Mais de 90% dos nossos associados são contra essa Resex. A categoria vai ser "podada", pois irão impor restrições da pesca nas três maiores lagoas da região - explica.

Outro nome tradicional da região, o empresário Marco Aurélio Morongo, também questionou a Resex.

- Vocês chegaram tarde aqui, pois Garopaba e Imbituba cresceram e têm uma economia forte sem precisar de vocês - disse na quarta-feira.

Para Morongo, dono de uma das grandes indústrias de acessórios de surfe do país, Garopaba nunca precisou do Ibama pois os moradores sempre cuidaram bem da natureza.

Prefeitos contestam a iniciativa

O prefeito de Imbituba, José Roberto Martins (PSDB), e o de Garopaba, Luiz Carlos Silva (PP), são contrários à criação da reserva. O temor são os efeitos que o fato poderá ter na vida econômica e social em cada um dos municípios.

Martins defende a realização de um plebiscito para que a população local tenha poder de decidir pela criação ou não da Resex.

- A implantação da reserva não passou pelo Congresso Nacional e nem por plebiscito, mas está sendo concluída. Se isso acontecer, acaba com a autoridade política e administrativa de toda a região - alerta.

Para ele, a legislação ambiental já está bem definida, e o poder público age com base no que determina a lei.

- Hoje, se eu autorizar uma obra irregular, vou preso. Mas com a Resex, vou ter que pedir autorização para fazer uma obra pública no meu município - lembra Martins.

Ele ainda afirma que a maioria da população do município está contra a idéia.

- Como prefeito, tenho obrigação de respeitar a vontade da minha população. Se for necessário, vamos para a Justiça - alerta.

O prefeito de Garopaba também acha que o plebiscito seria uma alternativa interessante para determinar a criação ou não da unidade. Ele participou da consulta promovida em Imbituba, na quinta-feira.

- Garopaba já faz parte do Parque da Serra do Tabuleiro e da Área de Preservação Ambiental (APA) da Baleia Franca, que também abrange Imbituba. Com isso, não há necessidade de uma Resex, mas poderíamos ter um plebiscito para validar a vontade do povo - sugere o prefeito.

Restrições preocupam empresário nativo

Natural de Ibiraquera (Imbituba), descendente do pioneiro Francisco Teixeira de Souza Filho, o empresário Maro Odi de Souza é um dos articuladores do movimento contrário.

- A unidade poderá criar várias restrições, especialmente com a área de amortecimento. Os investimentos não vão vir. Quem quiser investir no turismo daqui, por exemplo, vai acabar fugindo - alerta.



Agentes da Polícia Federal e soldados da PM, armados, garantiram a segurança no salão do Esporte Clube Campinense, local do encontro em Garopaba

Consultas ocorrem sob tensão e acusaçõesA consulta pública realizada quarta-feira para que a população de Garopaba pudesse questionar e apresentar alterações na proposta de criação da Reserva Extrativista da Pesca Artesanal (Resex) foi marcada pela tensão e tumulto.

Agentes da Polícia Federal e soldados da Polícia Militar (PM), todos armados, garantiram a segurança no salão do Esporte Clube Campinense e evitaram que os mais exaltados iniciassem alguma confusão.

Por volta das 18h, horário marcado para o início da consulta, cerca de 400 integrantes do grupo "Natureza Sim, Resex Não" já estavam em volta do clube. Uniformizados e com bandeiras, eles acreditam que a futura reserva coloque em risco a economia de Garopaba e de Imbituba.

Para manter a ordem, cerca de 300 pessoas tiveram o acesso ao clube e os demais precisaram acompanhar a audiência do lado de fora. A animosidade dos participantes acompanhou toda a audiência, desde a formação da mesa diretora, por volta das 19h20min, até as 23h30min, quando encerrou o evento.

Por causa disso, os integrantes do Ibama e Instituto Chico Mendes tiveram dificuldades para apresentar de maneira formal todo o projeto da Resex. Após as explicações, os organizadores concederam um espaço para que 40 pessoas, devidamente cadastradas, pudessem fazer questionamentos. Cada uma delas tinha dois minutos para as indagações, tempo quase sempre extrapolado em razão da euforia e indignação do público contrário à criação da Resex.

O medo das desapropriações sem indenizações e restrições de toda ordem foram os principais questionamentos do público contrário à Resex. No lado dos favoráveis, os pronunciamentos destacavam a preservação da pesca e meio ambiente, instrumentos que, segundo eles, são fundamentais para a manutenção do turismo nas praias e lagoas da região.

Na quinta-feira a consulta pública sobre a proposta de criação da Resex ocorreu em Imbituba. Diferente do clima de tensão que tomou conta da reunião de Garopaba, os ânimos dos manifestantes estiveram mais calmos, o que tornou desnecessária a revista no portão de acesso. A PM também não precisou portar armas para manter a segurança no salão paroquial da Igreja do Centro.

Mesmo com as vaias do grupo de manifestantes "Natureza Sim, Resex Não", a apresentação do projeto da reserva extrativista por parte do Ibama e Instituto Chico Mendes foi feita sem muitos problemas.

Episódios exigiram atenção da polícia

A consulta teve apenas dois episódios que exigiram maior atenção da PM. Primeiro, uma participante favorável à Resex tentou tirar satisfações do vereador de Garopaba, Jucélio de Souza (PP).

Pouco depois, os dois grupos rivais se provocaram durante alguns instantes, mas a confusão logo foi acalmada. No fim, alguns participantes e integrantes da mesa diretora trocaram acusações de antigos desdobramentos políticos locais que pouco contribuíram para os esclarecimentos sobre a Resex.

Situação foi mais tranqüila na segunda reunião, na quinta-feira, em Imbituba

As alegações:

Os contrários à Resex

O projeto está sendo imposto à comunidade local. Só tornou-se público quando já estava pronto. As reuniões anteriores teriam sido promovidas sem muito alarde e o que parece é que empresários e muitos pescadores só ficaram sabendo agora da intenção.

A criação e extensão da chamada área de amortecimento. Não há nenhuma definição sobre sua necessidade. Mas em alguns parques, como o da Serra do Tabuleiro, a área de manejo chega a 10 quilômetros de extensão, ou seja, num raio de 10 quilômetros só poderiam ser feitas obras ou novas construções mediante a aprovação do conselho gestor da Resex. O município não teria mais poderes sobre essas áreas.

Grande parte dos pescadores que participaram das consultas públicas alega que hoje poucos vivem só de pesca. A maioria aluga casas e barracos para os turistas, também trabalha em comércio e serviços (turismo) ou na construção civil. Temem, portanto, o efeito que a Resex terá em sua subsistência.

A falta de escritura de propriedades também amedronta os moradores locais. Muitos não possuem escritura pública de seus terrenos. Desapropriações seriam feitas sem nenhum amparo oficial, e sem que os moradores recebessem qualquer quantia
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Colônias de pescadores também questionam o apoio que o Instituto Chico Mendes alega receber de pescadores artesanais. Dizem que a associação de pescadores que encampa a reserva não representa a maioria.

Os favoráveis à Resex

Tanto representantes do Instituto Chico Mendes quanto a comunidade favorável ao projeto alegam que a Resex foi amplamente discutida. Listam um total de 40 reuniões técnicas, 15 reuniões comunitárias, oito plenárias da Agenda 21 e mais três seminários.

Os defensores da reserva destacam que a área de amortecimento não foi delimitada ainda. Só será definida pelo conselho depois do decreto de criação da Resex ser assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Não se sabe como será resolvida a questão da área.

Segundo os representantes do Instituto Chico Mendes, a Resex tem intenção de preservar a natureza e incentivar o turismo inteligente. A Resex só permite a pesca artesanal com o objetivo de gerar subsistência das famílias de pescadores e preservar as suas tradições. Querem acabar com a pesca profissional e a especulação imobiliária.

Um plebiscito para referendar a vontade da comunidade, como sugere o prefeito de Imbituba, Beto Martins (PSDB), poderia ser realizado, mas não faria muito sentido, já que a Resex não vai tomar terras municipais e sim as terras federais, especialmente os terrenos de marinha. n

* Colaborou Ligia Gastaldi
MARCELO BECKER Imbituba/Garopaba






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